Numa conversa que tive com uma pessoa lembrei-me destes dois poemas de Fernando Pessoa:
Gato que brincas na rua
Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.
Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.
És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.
Pobre ceifeira
Ela canta, pobre ceifeira
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,
Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.
Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz à o campo e a lida,
E canta
Mais razões p'ra cantar que a vida.
Ah! canta, canta sem razão!
O que em mim sente 'stá pensando.
Derrama no meu coração
A tua incerta voz ondeando!
Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência
Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!
5 comentários:
Poemas muito bonitos e fazem muito sentido. Às vezes, quem me dera ser gato ou ceifeira.
Confesso, como acho que já te disse antes, que não sou o maior fã do Fernando Pessoa, que tanto gostas. Mas também é verdade que em alguns poemas, como estes dois - e outros -, consigo perceber o génio, para lá do absinto.
Pois, Fernando Pessoa era um génio, e como tal sofria de dor de pensar. Que é a característica presente nos poemas que referiste.
Ele afirma que quem pensa nunca poderá ser feliz.
Pois o pensamento leva à obsessão do conhecimento.
Gosto muito desses poemas.
Eleva-nos a um ponto pelo qual passamos mas que por vezes nem damos conta...!
Olá! Sou uma grande fã de Fernando Pessoa, mas confesso que ás vezes tenho bastantes dificuldades em decifrar o que este grande génio nos quer transmitir, e em decifrar o que lhe ia pela cabeça ao escrever sertos poemas.
No entanto, nestes 2 não tive grandes dúvidas porque, tal como disse o "anonimo", como todas as pessoas que se dão ao trabalho de pensar e de se questionar sobre o que nos rodeia, também tenho as minhas épocas da "dor de pensar"... nestas alturas penso que talvez seria mais fácil ser ingorante e não me questionar sobre nada á minha volta, viver numa ilusão estúpida!
iozjjhv
isto é uma cena que a mim nao me assiste
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